A invasão dos chineses

Leio quase que diariamente notícias em sites, blogs e revistas especializadas em automóveis, ou mesmo matérias sobre carros em jornais diários, e venho observando, com agrado, o avanço dos carros chineses em nosso mercado. Aqui mesmo em minha cidade tive uma grata surpresa quando acompanhei a abertura da mais nova concessionária da maior fabricante chinesa da atualidade, a Chery Motors. Ainda não tive a coragem de entrar, talvez até porque não esteja interessado em trocar de carro no momento, porém, confesso que fiquei surpreso por sua beleza e organização, superior até as demais revendas de marcas consagradas no Brasil.

Voltando a falar especificamente dos carros chineses, surpreendo-me a cada lançamento, ou mesmo promessa de lançamento. Digo isso pois, às vezes, um modelo é apresentado à imprensa especializada e só começa a ser vendido muito tempo depois. Posso listar várias montadoras ávidas por estrear no então gigante mercado de veículos do Brasil, o quarto colocado no mundo, ficando atrás apenas da própria China, Estados Unidos, e Japão, segundo dados da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea). Chery, Jac, Effa, Chana, Brilliance, Gelly, Lifan, Jimbei, Hafei, Haima, Byd, Dongfeng, entre outras, estão na lista entre as montadoras que já atuam em solo brasileiro ou estão às vésperas de desembarcar por aqui.

Quando se fala em carros chineses, nos vêm à mente vários preconceitos. Ou os veículos são cópias de carros já consagrados mundo a fora ou desconfia-se da segurança dos modelos lá fabricados. Estas características já não fazem parte de muitos dos carros aqui desembarcados. Muitas montadoras buscam na Europa o auxílio de consagrados estúdios de design para desenvolverem seus carros. Foi-se o tempo das cópias mal feitas e desenhos de gosto duvidoso. Vários modelos já possuem assinatura de grandes nomes mundiais, como o ItalDesign de Giorgietto Giugiaro e o estúdio Bertone, ambos na Itália. E isso podemos ver nos modelos já lançados em nosso mercado. Muitos deles são bem apresentáveis, com desenho correto e bastante honesto em comparação aos carros aqui fabricados.

Com relação à segurança dos carros chineses, observamos pela imprensa especializada que muitos modelos pecam em termos de resistência e durabilidade. Foram realizados crash-tests nos mercados que receberam esses veículos antes de nós e muitos deles se saíram mal nos testes. A questão da segurança realmente é muito importante e aqui cabe uma ressalva: no Brasil, estamos caminhando para a obrigatoriedade, a partir de 2014, de equipamentos de segurança de série em todos os veículos. Air-bags e freios ABS passarão a ser obrigatórios nos nossos carros. Se observarmos os automóveis de hoje, pouquíssimos saem de fábrica com estes equipamentos de série. Apenas modelos mais caros e preferencialmente importados já oferecem tais “luxos”. Sim, aqui no Brasil, estes equipamentos ainda denotam luxo ao veículo. O absurdo chega a tal ponto, que alguns veículos não se encontram aptos a receberem tais equipamentos, como a Kombi e o Mille. A Fiat tratou rapidamente de lançar o novo Uno, não só para atualizá-lo em termos de design, mas também para prepará-lo para a obrigatoriedade futura. Quanto à Kombi, morrerá inevitavelmente, pois trata-se de um veículo reconhecidamente inseguro.

Quando observamos os modelos chineses que aqui já se encontram à venda,  surpreendemos-nos com uma vasta lista de equipamentos de série. Pelos meus cálculos, 99% deles já saem de fábrica completos, inclusive com os equipamentos básicos de segurança: Air-bags e freios ABS. Com relação aos demais itens como direção assistida, ar condicionado, vidros, travas e retrovisores elétricos, 100% dos modelos já possuem tais itens de conveniência e conforto. Retornando ao Brasil, qual a porcentagem de carros brasileiros que nos são ofertados de série com itens básicos como direção assistida ou ar condicionado? Quase nenhum. Observam-se os famosos e campeões de venda VW Gol, Fiat Mille e Pálio, Chevrolet Celta e Classic, Ford Ka e Fiesta; nenhum deles traz de série sequer direção hidráulica, e ainda assim são os “queridinhos” do povo brasileiro.

Interessante mesmo foi observar recentemente a criação, ainda que embrionária, do Latin N-Cap, entidade que irá avaliar os veículos fabricados e vendidos no Brasil e em toda a região latino-americana. Os resultados que saíram há poucas semanas foram desastrosos. Alguns dos veículos submetidos aos testes como Peugeot 207, VW Gol e Fiat Palio, tiveram resultados, no mínimo, decepcionantes. Os modelos citados receberam apenas 1 ou 2 estrelas das cinco possíveis. Somente carros de categoria superior conseguiram se sair melhor, como o Toyota Corolla e o Chevrolet Meriva. Com os resultados obtidos nesses primeiros testes, a própria entidade declarou que os carros populares brasileiros têm nível baixo de segurança e salientou que é preciso investir em publicidade sobre a importância do uso de cadeirinhas para crianças, air-bags, freios ABS e controle de estabilidade.

No breve resumo aqui apresentado me pergunto, tentando quantificar o quanto nós brasileiros estamos em melhor situação que os chineses, em termos de qualidade e segurança em nossos automóveis. Talvez não tenhamos assim tantos argumentos para criticar os famigerados modelos chineses. Em alguns aspectos, acredito que eles estão a nossa frente, principalmente pelo fato de já terem se aventurado por mercados muito mais exigentes que o nosso, como Europa e Japão, adequando-se às características mais rígidas desses países. É óbvio que nossos carros, por terem sido fabricados especificamente para nosso mercado, possuem características que se adaptam melhor ao nosso clima, nossas estradas, enfim, ao gosto do brasileiro, porém não consigo enxergar tanta diferença entre nossos carros e os chineses. Até a criticada baixa qualidade no acabamento também pode ser encontrada com facilidade em nossos populares. Acho que em pouquíssimo tempo, eles já estarão adaptados e serão até fabricados por aqui (Fábrica da Chery em SP), desmistificando de uma vez o receio imposto pelas tradicionais montadoras aqui estabelecidas e principalmente de alguns formadores de opinião nada imparciais. Eu mesmo, por exemplo, já estou a um passo de me aventurar em minha próxima troca de carro.